terça-feira, 1 de março de 2016

Sobre Paisagem Suplente


Contava-se muito acerca das viagens que ficaram por fazer. Pisar uma certa terra estrangeira para lhe encontrar algo de novo, sem saber que na verdade se tratava de uma familiaridade. Só se vai realmente quando o espirito vai também; a esse espirito, capaz de experiência estética, pode ir tanto quanto queira a própria criação. Quanto queira outro homem assumir uma persona explorando-se através dela – fazendo confundir um traço de personalidade na poesia ou uma experiência universal com a ficção. Talhar nestas palavras é já um ato heurístico, o primeiro ato heurístico numa viagem que se quer começar – onde importa mais a nave espacial que nos conduzirá do que a Lua a onde chegaremos. Onde importa reformular, voltar a ler livros que já foram lidos e músicas que serão sempre um padrão matemático repetindo-se até à infinita exaustão.
Uma viagem que parte sempre para um Novo Mundo, explorando com o espirito a sua própria existência. O afeto que decorre da interrogação da existência suplanta todos os lugares a que o corpo não pode ir. Só assim nos pode ser permitido criar algo, quando existe pela vida, onde viajamos, o afeto pelo tempo presente em que decorre. Só com esse exagero pela vida somos capazes de nos parecer um pouco mais com o divino e tendermos à criação.  Seremos capazes de traçar as paisagens, inclusive aquelas que ainda não vimos, às quais ainda não chegámos e provavelmente serão só uma experiência estética única – como são certos modos num povo estrangeiro. Tudo o resto é uma esperança ténue de que essa memória não se apague; e que não se apague porque é Arte e pode conter alguma verdade – como um presságio para um movimento que teime em procurar dentro de certas gramáticas a possibilidade de lhes sermos rebeldes - e através da Arte agir contra o que está erroneamente instituído.
Neste lugar em especial, uma paisagem com vista para a Literatura, Música, Belas Artes, Cinema e Filosofia da Estética - assim como a difusão de trabalhos académicos que versem sobre as Humanidades e demais Ciências Sociais, capazes de descodificar o corpo da criação artística.  A possibilidade de escrever, traçar um risco ou encadear uma sequência de acordes – que serão sempre familiares a qualquer coisa. Criações que, uma vez terminadas, são finalmente uma terra estrangeira; uma paisagem suplente de todos os lugares que já fomos e ainda estamos para ser.

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