quinta-feira, 3 de março de 2016

Águas-furtadas

(Desde menina que desejei viver
Num oásis isolado do resto do mundo…
Um lugar especial, inteiramente meu,
Em que a enormidade do manto do céu
Me engula na sua garganta sem fundo,
Até me encontrar e me tornar a perder.)

Aqueles que caminham pelas estradas
Pousam os olhos no chão que pisam,
O meu olhar curioso erguia-se ao alto,
Mais alto que o cimento e o asfalto,
E visava o que outros olhares não visam
Nas suas visões rotineiras, agrilhoadas…

Não temo o silêncio nem a solidão,
Não são as ideias a que me confino,
Os meus receios são barcos passageiros
Que trazem a fúria de mil marinheiros…
Mas este local que, para mim, imagino
Ergue-se sobre toda essa negridão.

Um local para admirar as manhãs alvas,
Em que a máquina mundana não me viole,
E poder olhar as nuvens encasteladas
No meu canto, nestas águas-furtadas,
Com os seus parapeitos beijados pelo sol
Perfumados pelo desabrochar das malvas.


Ana Caeiro

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