quinta-feira, 24 de março de 2016

a última peça

a última peça que não vi no teatro em Atenas
porque me diziam ter visto vida junto à ágora 
e eu fui desgraçado
porque todos vamos cumprindo com as coisas que iludem o mundo
essa peça que terá sido inspirada em algum mito oriental
que nas costas de um poeta chegou a Éfeso
e só depois ao Piréu
testemunhando a geometria das coisas antigas 
que se enganaram na origem mas acertaram no destino
essa equação difícil e igualmente antiga que chamamos de amor
não resolve nenhum problema
não cura
nem nunca salvou ninguém de se apagar 
as imagens de uma terra final 
em que as mulheres se sentam à nossa espera
para depois se tornarem árvores de fruto 
e em tudo aquilo que uma criação pode com o corpo 
sem sair do lugar 
assim as mãos adornando o barro dos vasos 
depois da espera 
ou do fruto esbatido nas redes de apanhar 
e assim isto depois de tanto tempo 
de tanta água a bater em finisterra 
de tantas peças que fui ver para me contarem o mundo
à procura do texto da primeira cosmogonia
para me perceber e perceber o que viam os meus olhos
para recomeçar o mundo e contar de novo
quanto tempo daqui até à morte
até à ágora da última assombração

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